segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

jamaxi pg 424-429

CANTO XX

PUERTO ACRE: CAPITULAÇÃO E PAZ

No mais alto barranco, numa curva
o seu canhão divisa o panorama:
numa ponta do rio é “Caquetá”
e noutra é “Bom Destino”, frente é a margem
e atrás o descampado e a floresta.
Entre os dois seringais está Puerto Acre
envolta por trincheiras que a defendem.
No outro lado do rio, acreanas sapas
e atrás, em cada lado, batalhões
vêm estreitando o ofensivo anel.
O amarelento rio enchendo afoga
os baixios em redor da cidadela,
alarga-se o estirão entre as extremas
e Puerto Acre é um barranco dominando.
Janeiro a bruma e a cerração a oculta
toda vez que o sol nasce tardiamente,
neblina e chove quase todo o dia,
tristezas despertando apreensões.
Ao longo do barranco a espreguiçar-se
ziguezagueam sapas na lombada
e as trincheiras se escavam na clareira
entre a cidade e a mata que ameaça.
Numa das bocas corre entre as duas margens
a corrente que fecha o rio acima:
nenhum nativo baixando passará,
e o “Independência” tenta atravessar.
Mas enfrente na oposta margem baixa,
na curva do outro extremo da estirão
e por trás da clareira da floresta
agacham-se piquetes avançando.
São tiros lado a lado, noite e dia.
Nas pausas das descargas quando chove
o tiroteio cessa dos dois lados.
A água que cai das frontes causa medo
e “recuerdos” da Pátria e das montanhas.
São arrependimentos, ansiedades,
sofreguidões de esfomeadas bocas
e imprecações de esquálidos soldados,
no dever de lutar em terra hostil
e na hora de morrer por patriotismo.
Mas por que novamente reviver
na “miração da iuasca” a quinta-feira
daquele dia quinze de janeiro
do ano de mil e novecentos e três?
Numa vara comprida, aquela flâmula
do outro lado do rio frente a Puerto Acre
dizia o Coronel Lima Romero
que o embate decisivo iria travar-se.
Por que rememorar aqueles dias,
dez ou doze, não importa quantos foram,
durante os quais mil onças acuavam
patriotas da Bolívia na sua toca?
Foi se fechando o cerco palmo a palmo,
ao ponto de se ouvirem mútuos gritos
da soldadesca insone e enlameada
a ver luzir um faiscante sabre...
Por fim, após cerrados tiroteios,
no dia vinte e quatro de janeiro
uma bebedeira branca a pedir trégua
dizia que Puerto Acre iria render-se...
Nesse histórico instante se esfumou
o sonho imperialista no Noroeste:
caiu Puerto Acre, esfomeada e exausta,
com mortos e feridos, mais com honra!
Seu vencedor surgir no seu uniforme
de azulado algodão sem distintivos
além de um lenço branco no pescoço
e um pedaço de fita no seu quepe.
A esse jovem gaúcho sem dragonas
rendeu-se o Coronel Lima Romero
que a lhe fazer entrega da sua espada,
de volta a recebeu num preito à paz.
E agora em Xapurí medida a História
ao ver Puerto Acre ensarilhar suas armas
e o Brasil intervir mandando força
para ocupar seu novo Território.
Os rifles, carabinas e mosquetes,
alemães “manuliches” e “winchesters”,
americanos “papos-amarelos”,
canhão, metralhadoras, espingardas
e outras armas que lá mandavam chumbos
calaram-se depois de nove dias
de intenso tiroteio lado a lado, de quinze a vinte e quatro de janeiro.
— “Pero usted es mui joven!” – se surpreende
o bravo Coronel Lino Romero
ao ver na trégua Plácido de Castro
entrando nas trincheiras bolivianas.
“Heróicos defensores de la pátria”
nas imundas trincheiras da borracha
cheirando a “fetidez de los cadaveres”
“la cabeza em sus rifles” cochilavam.


CANTO XXI

O “MODUS VIVENDI”

Ao fim de qualquer guerra em todo o mundo,
nas tréguas, armistícios, rendições,
juristas, diplomatas e políticos
nova guerra começam pela paz.
Em Puerto Acre as culatras se engasgaram
e os rifles lado a lado ensarilharam-se,
à Pátria os defensores retornaram
com honras, distinções e o alto respeito
que os vencedores sempre tributaram
na bela tradição cavalheiresca
aos que por glória lutam bravamente
e por honra se rendem nos combates.
Em nome do Brasil o General
Olympio da Silveira veio ao “Empreza”
- do Acre Setentrional Governador-
para ocupar militarmente a terra.
Ao passar em revista os seus soldados
nas comemorações do seu triunfo
foi Plácido aclamado pelo povo,
que aos vivas reaclamou o Estado Livre,
proclamando-o também governador.
O Barão do Rio Branco, nesta altura
para o Brasil na paz ganhava a guerra,
ao ocupar na paz toda a fronteira.
Aquele general foi despachado
com navios de uma esquadra e Batalhões
e Plácido de Castro recuou
seu Quartel-General para o alto-rio.
Expulsas do Acre as tropas da Bolívia,
seu governo e o Barão por meios hábeis
decidiram selar de vez a paz
e a questão de limites resolver.
Ao General Olympio da silveira
foi Plácido de Castro expor seu plano
de alargar as fronteiras brasileiras
indo ao encontro das frentes avançadas.
Quis prosseguir a guerra na fronteira:
no seringal “Boa Fé” além do “Empreza”
aquartelou sua tropa, com piquetes
avançou para dentro da Bolívia.
O Presidente Pando se afastara
de La Paz para vir vingar sua pátria
e Plácido de Castro foi barrar
as colunas que vinham reforçadas.
Já estava muito dentro da Bolívia
através de incursões nas cabeceiras
indo atrás desta vez de generais
às margens do Órton, além do Tahuamanu.
Gironda, Puerto Rico e Riberalta
estavam na sua mira quando em março
a vinte e um a Bolívia e o Brasil
por um “Modus Vivendi” se entenderam.


CANTO XXI

O TRATADO DE PETRÓPOLIS: PAZ NA FRONTEIRA NOROESTE

Se Plácido de Castro não foi parte
nas discussões da paz era evidente
que o General Olympio iria entender-se
com o Presidente Pando em Puerto Rico.
No seringal Boa-Fé uns descontentes
por pretextos à toa não cumpriram
as ordens dos seus chefes acampados
e aquele General se intrometeu.
Já havia instigações no acampamento
para um Golpe de Estado no “Boa-Fé”:
revoltou-se um piquete e ao “27”
cabeças do motim se apresentaram.
Por este fato o General Olympio
e Plácido de Castro começaram
a se desentender e a se insultarem,
conforme desejava o General.
Foi desarmado o Exército Acreano
e também confiscada a sua Flotinha,
mas Plácido de Castro sabiamente
soube agir com presteza e decisão,
Num manifesto ao povo que o aclamou
acusou pelo golpe o General,
por terminada deu a sua carreira
e revidou com brio a vil manobra.
Promoveu por lealdade os mais fiéis,
indignos traidores expulsou,
batalhões dissolveu e extinto o Exército
também se dissolveu o novo Estado.
Coube ao grande Rio Branco finalmente,
a missão de escrever o fim da História,
através do Tratado que em Petrópolis
a Bolívia e o Brasil a paz selaram.

(Océlio de Medeiros; Jamaxi – A poesia do Acre em três tempos (hoje, ontem e anteontem); Rio de Janeiro, Ed. Arquimedes, 1979 – págs. 424 - 429)

Ola

ola eu sou neto de ocelio de medeiros um grande poeta,professor e ex deputado falecido em 5 de março de 2008 neste blog eu irei postar as muitas poesias dele sobre o acre.